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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Tucano quer impor censura na internet

Ele quer vigiar o que você acessa

O artigo é de 2008, mas ainda está valendo:


Em nome do combate à pedofilia, projeto de lei criminaliza práticas triviais na internet com até 4 anos de prisão

por Ronaldo Lemos

O Senado acaba de aprovar o projeto de lei do senador Eduardo Azeredo sobre crimes digitais. Em nome do combate à pedofilia online, o projeto aproveitou para criminalizar também práticas triviais na internet e criar um sistema de vigilância privada sobre os internautas, criando uma série de obrigações para os provedores. Condutas triviais, como acessar um site em desacordo com a autorização de seu titular, desbloquear um telefone celular ou resgatar as músicas pagas legitimamente de um iPod passam a ser crimes punidos com pena de até 4 anos de reclusão. Curiosamente, dentre os mais de 40 dispositivos constantes do projeto apenas um deles trata da pedofilia, tema que merece toda atenção e combate, mas não justifica a criminalização da rede no Brasil.

A aprovação do projeto de lei de cibercrimes pelo Senado levanta ao menos duas reflexões importantes. A primeira é sobre como as leis são feitas (já dizia Bismarck que o melhor é não saber). A segunda diz respeito ao papel da internet para o futuro do sistema político.

O projeto de lei 89/03 tramitou a passos largos. De sua aprovação na Comissão de Constituição e Justiça até sua votação no Senado transcorreram pouco mais de 20 dias. É muito pouco para uma questão tão complexa e controversa, que despertou tamanha reação por parte da sociedade. A reclamação geral é de que o texto não foi discutido o suficiente. O professor Pedro Rezende, da UNB, que acompanhou de perto sua tramitação, relatou que nas poucas audiências públicas realizadas em Brasília foram vetados convites a quem discordava do texto. Com isso, criou-se um círculo de aparente legitimidade em torno do projeto, isolando-o dentro de sucessivas camadas burocráticas (para usar a imagem de Hannah Arendt). Isso impediu que a discussão com a sociedade se tornasse mais abrangente, ao mesmo tempo em que apressou sua aprovação. Contradizendo essa suposta legitimidade, assim que a votação no Senado foi anunciada uma surpreendente reação pública contrária teve lugar.

É interessante como em todos os momentos a justificativa do projeto baseou-se em informações desencontradas. Um exemplo é o argumento da pedofilia, mencionado acima, da qual o projeto trata em apenas um artigo. Outro é a insistente referência à Convenção de Budapeste sobre Cibercrimes. Sempre que o projeto era questionado, a convenção era invocada para legitimá-lo.

Ocorre que o Brasil não é signatário da referida convenção. Por essa razão, não tem obrigação de adotá-la. Mais importante ainda é o fato de o texto da convenção ser um dos mais controversos no cenário internacional. Apenas 43 países a assinaram, e destes, somente 21 se comprometeram com a ratificação. Trata-se de número expressivamente baixo para um tratado internacional lançado há mais de sete anos. Dentre os países que adotaram a Convenção de Budapeste, a maioria consiste de países desenvolvidos, cujas regras sobre a internet já se encontram amadurecidas. Os Estados Unidos, por exemplo, somente ratificaram o tratado após fazer 13 ressalvas ao texto.

Esse é um ponto a ser enfatizado: a internet brasileira precisa de uma regulamentação civil, e não criminal. Com a aprovação do projeto no Senado, nossa primeira lei abrangente sobre a rede corre o risco de ser um frankenstein criminal, aprovado às pressas. Não temos legislação que trate de temas como a privacidade online, o regime de proteção aos dados pessoais, as salvaguardas e responsabilidades dos provedores, o comércio eletrônico e os serviços online. O caminho natural é a regulamentação civil. A lei penal deve se aplicar só a casos excepcionais (o direito criminal é considerado ultima ratio, isto é, quando tudo mais dá errado, recorre-se a ele). No Brasil fez-se o contrário: em vez de se regular a internet civilmente, optou-se por se tratar de todos esses assuntos diretamente por meio do direito penal.

O efeito prático será entregar ao juiz criminal a responsabilidade pela regulamentação da internet brasileira. O mesmo juiz que cuida de homicídios, seqüestros e latrocínios terá de decidir sobre a proteção de dados pessoais, a responsabilidade dos provedores e outras questões técnicas e complexas, que guardam pouca conexão com seu âmbito cotidiano de atuação.

Uma mobilização online contra o projeto surgiu com força assim que a notícia de que o mesmo seria votado foi publicada. Em cinco dias, uma petição online conseguiu 25 mil assinaturas (www.petitiononline.com/veto2008).

Por fim, se o Brasil é o país do futuro, é porque a sociedade brasileira sempre operou em rede. Isso nos faz ocupar uma posição privilegiada internacionalmente e traz consigo uma oportunidade. No passado, o País perdeu ondas de desenvolvimento importantes. Perdeu a onda industrial do começo do século 20. Perdeu também a onda dos semicondutores na década de 70, aproveitada com maestria pelos tigres asiáticos.

Atualmente, existe uma janela de oportunidade relativa à nova onda de desenvolvimento trazida pela sociedade da informação. Para aproveitá-la, o requisito mínimo é a previsibilidade jurídica. É preciso criar um ambiente que defina com clareza as regras do jogo, trazendo segurança para usuários, empreendedores e provedores de serviço e acesso. Ao criminalizar a rede de forma tão ampla, as possibilidade de inovação são engessadas e a incerteza passa a ser a regra. Congela-se a rede no tempo. Quem se arrisca a desenvolver novas formas de processar a informação, realizar novos tipos de conexão entre os dados digitais, se o risco incorrido é regulado pela lei criminal?

*Ronaldo Lemos é diretor do Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da FGV-RJ. Tem mestrado pela Universidade Harvard e doutorado pela USP

Fonte da Notícia

Um comentário:

Cara Legal disse...

A sensatez do nosso grande mandatário não dará vida à esse pergaminho da opressão medieval que setores da direita querem imprimir sobre as famílias trabalhadoras de bem.