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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Darpa vai financiar estudos sobre viagens interestelares



Alfa Centauri ou além. A agência governamental americana que ajudou a inventar a internet agora quer fazer o mesmo para viagens interestelares. No que talvez seja a mais ousada oportunidade no setor de incubadoras de empresas, a Agência de Pesquisas de Projetos Avançados de Defesa dos EUA (Darpa) planeja dar a uma sortuda e apaixonada organização US$ 500 mil em financiamento para que comece os estudos sobre o que seria necessário do ponto de vista organizacional, técnico, sociológico e ético para enviar humanos a outras estrelas, um desafio de tal de magnitude que apenas esses estudos poderiam levar cem anos.
A concessão dos fundos, prevista para 11 de novembro (11/11/11), será o ponto alto de um esforço conjunto da Darpa e da Nasa batizado "Estudo da nave de 100 anos", que teve início no fim do ano e incluirá um simpósio público de três dias em Orlando, Flórida, em 30 setembro, para debater as razões para e os meios de empreender uma viagem interestelar. A agenda vai além de tecnologia de foguetes e inclui tópicos como considerações legais, sociais e econômicas de viagens do tipo, preocupações religiosas e filosóficas, para onde ir e - talvez o mais importante - como inspirar o público para apoiar este sonho tão caro.
O plano da Darpa gerou agitação e perplexidade nos laboratórios, bares, restaurantes e sites que cercam os centros de pesquisa da Nasa tanto fisicamente quanto virtualmente, onde o sonho das viagens espaciais nunca morreu e onde alguns grupos de cientistas e engenheiros teimosos, alimentados por histórias de ficção científica e profecias, desenham naves que poderiam cruzar o espaço interestelar, incubando a tecnologia e a preservando para o dia em que será usada.
- Se você quer ter um hobby, por que ele não pode ser o desenho de naves interestelares? - diz Andreas Tziolas, professor da Universidade do Alaska e diretor do Projeto Icarus, um esforço voluntário mundial para desenhar uma nave que poderia levar uma sonda científica até uma estrela próxima - talvez Alfa Centauri, a 4,4 anos-luz daqui - em uma viagem que levaria menos de 100 anos.
- Isso é o que fazemos - complementa Louis Friedman, ex-diretor executivo da Planetary Society, na Califórnia, que se auto-intitula a maior organização espacial pública do mundo.
Muitos cientistas se perguntam se a vida, especialmente vida inteligente, existe fora da Terra. Um dia, prometem os sonhos interestelares, a vida lá fora seremos nós. Pessoas como Tziolas dizem que a tecnologia já existe ou existirá em breve para mandar instrumentos e talvez até pessoas para estrelas próximas, embora o voo tripulado possa custar centenas de trilhões de dólares. O meio milhão que a Darpa vai dar não é suficiente para construir uma nave estelar ou mesmo comprar um escritório modesto onde imaginar uma - mas é suficiente para dar início a um levantamento de recursos e, talvez, atrair críticas de como os gastos governamentais são ridículos.

Um voo interestelar tripulado está a pelo menos um par de séculos de distância e, com exceção da invenção de motores warp no estilo "Jornada nas estrelas", pode demorar outros séculos para ser completado. Quem quer que embarque nesta jornada certamente não vai voltar.
Mas há muitas razões para que os humanos eventualmente clamem pela vontade política de realizar a viagem, dizem os cientistas, se não pela natureza inquieta que nos tirou das cavernas e nos fez cruzar os oceanos, então para escapar de sermos dizimados pelo aparecimento de um asteroide assassino ou porque o Sol fez ferver os oceanos, o que ele fará em um par de bilhão de anos.
Outro atrativo poderia ser a descoberta de um planeta habitável em outro lugar, algo que poderia acontecer nos próximos anos por meio dos esforços do observatório espacial Kepler, da Nasa, e outros projetos astronômicos do tipo, considera Jill Tarter, astrônoma o Instituto SETI que dedicou sua vida à busca por extraterrestres.
- Isso se tornará uma realidade quando tivermos um análogo da Terra como destino - diz ela.
David Neyland, diretor de tecnologias táticas da Darpa, está enfrentando problemas para explicar que o objetivo do projeto não é construir uma nave interestelar, mas apenas um plano de negócios para desenhar uma. A busca, explica, é por uma organização, presumivelmente privada, que possa desenvolver uma visão interestelar sem o auxílio do governo, carregando o fardo pelos próximos cem anos e desenvolvendo valiosas alternativas tecnológicas da mesma maneira que o investimento em protocolos de dados permitiu o surgimento da internet. O cronograma foi inspirado por Júlio Verne, cuja novela "Da Terra à Lua" foi publicada em 1865, 104 anos antes da viagem virar realidade). Depois de novembro, qualquer que seja essa organização ela estará por conta própria.

- Não pretendemos levar à frente o projeto - acrescentou Neyland. - A Darpa vai entregar as chaves para esta entidade e lhes desejar boa sorte.
A viagem interestelar é um desafio enorme. A Voyager 1, artefato mais veloz já construído pela Humanidade, agora viajando a uma velocidade de mais de 60 mil quilômetros por hora em relação ao Sol, levaria mais de 70 mil anos para chegar a Alfa Centauri se estivesse indo na sua direção.
No fim dos anos 50 e início dos 60, um grupo de físicos liderado por Theodore Taylor, da General Atomics, e Freeman Dyson, do Instituto de Estudos Avançados, propuseram impulsionar a nave com as ondas de choque de bombas atômicas atiradas uma atrás da outra em sua traseira a cada três segundos. Tal nave, calcularam, atingiria Júpiter em um ano, mas levaria centenas de anos para chegar a Alfa Centauri.
A Sociedade Interplanetária Britânica usou um forma mais benigna desta ideia de propulsão no seu estudo de uma nava interestelar, o Projeto Dedalus, nos anos 70. A nave deles seria alimentada por pequenas explosões termonucleares provocadas pela compressão de núcleos de deutério e hélio 3 com raios laser. Ela levaria uma sonda científica de 500 toneladas até a Estrela de Barnard, a 5,9 anos-luz, em cerca de 50 anos, alcançando uma velocidade máxima de 12% da velocidade da luz no caminho.
- Este foi o primeiro estudo que provou que é possível viajar para outra estrela com os conhecimentos que temos hoje - diz Tziolas.



Em anos mais recentes, outras colaborações virtuais entraram na festa. A Fundação Tau Zero, baseada em Cleveland, foi fundada por Marc G. Millis, que dirigiu pesquisas sobre produção no Centro de Pesquisas Glenn, da Nasa, para encorajar o trabalho em "um voo interestelar prático". No ano passado, Millis calculou que levaria pelo menos 200 anos para que a sociedade tenha os recursos energéticos de forma a mandar 500 pessoas para fora do Sistema Solar.
Uma variedade de sistemas de propulsão tem seus fãs e podem prevalecer no longo período entre hoje e o dia do lançamento, um problema que Millis classifica como "obsolescência incessante". Entre elas estão gigantescas velas empurradas pelo luz solar ou poderosos feixes de micro-ondas e motores a íons que usam feixes de partículas energizadas para realizar a propulsão.
Já sondas científicas poderiam partir antes e de forma mais barata, destacou Dyson recentemente, acrescentando que em breve toda informação genética necessária para reconstruir a biosfera da Terra poderia ser acondicionada em algo do tamanho de um ovo. Dispersados rumo a diferentes planetas, estes "ovos" poderiam criar lares longe do lar que estejam a nossa espera.
- A nova tecnologia será biológica e tornará todo o resto obsoleto - avalia.
Em janeiro, Neyland e Pete Worden, diretor do Laboratório de Pesquisas Ames, da Nasa, convidaram cerca de 30 cientistas, empreendedores e escritores de ficção científica para uma sessão de criatividade no Norte da Califórnia. Neyland descreveu o primeiro encontro como uma tentativa de superar "o fator riso" associado ao assunto. Os participantes incluíram cientistas como J. Craig Venter, o primeiro a sequenciar o genoma humano, e escritores como Joe Haldeman, autor da premiada novela"The Forever War". Um dos participantes disse que "algumas pessoas estavam do outro lado da realidade".
Novamente, ninguém é esperto o bastante para saber o que resultará do esforço em torno do projeto de uma nave interestelar, destacou Neyland. Seria ingenuidade pensar que sabemos as perguntas certas a serem feitas, disse:
- Se você pedisse para Einstein e Marconi em 1910 que definissem um sistema de comunicação global para pessoas comuns, teriam eles dado como resposta com o iPhone?
O chamado para o encontro em Orlando atraiu centenas de respostas, que estão sendo selecionadas para decidir quem vai discursar. Tarter, a astrônoma do SETI, coordenará os debates sobre para onde ir. Ela recebeu 50 a 60 propostas, que classificou como "um saco de gatos", algumas com cara de relatos sobre discos voadores.
- Talvez tenhamos que ser um pouco loucos para pensar nisso seriamente - diz. - Todos lemos ficção científica o bastante para sermos fundamentalmente otimistas sobre os possíveis resultados.
Kelvin Long, estudante de Física da Universidade Warwick e integrante do Projeto Icarus, diz que já pensou na planta, organização e até no jardim japonês no quintal da pirâmide do Instituto Interstelar, onde as pesquisas em torno da viagem seriam eventualmente realizadas.
- Muitos de nós somos bem jovens. Crescemos ouvindo falar do Programa Apollo - conta. - Queremos fazer parte de uma jornada significativa. Pensamos em maneiras de fazer algo importante, que é levar os humanos para as estrelas.
Long cita Arthur C. Clarke, falecido escritor sobre fatos e ficções científicas que inventou a ideia de satélites de telecomunicação e ajudou a Sociedade Interplanetária Britânica: "Se você acredita que algo é possível, você pode fazer isso acontecer".




O Globo


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